Crivella, o Ministério da Pesca, a tentativa de atrair evangélicos, Edir Macedo e o aborto
Hora
de entender a notícia, que hora tão feliz! Esses posts sempre acabam
demorando um tantinho porque requerem pesquisa no arquivo do próprio
blog etc. Mas acho que vale a pena. A memória e a história são duas das
coisas que nos distinguem dos bichos.
O governo
anunciou que o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), bispo da Igreja
Universal e sobrinho de Edir Macedo, que é dono da igreja e da Rede
Record, é o novo ministro da Pesca. Faz sentido: é cantor gospel e já
fez um curso de engenharia. É tão habilitado para cuidar da pasta quanto
Ideli Salvatti e Luiz Sérgio, os dois que o antecederam.
O Ministério
da Pesca poderia ser considerado um símbolo da eficiência petista.
Segundo o IBGE, quando a pasta foi criada, em 2003, o superávit do setor
pesqueiro era de US$ 222.804.451. No ano seguinte, esse saldo positivo
já havia caído para US$ 175.330.847. Depois foi para US$ 103.576.102… Em
2006, começou o déficit, que foi crescendo, até chegar ao resultado
negativo de US$ 757.169.796 em 2010. Viram? O PT não brinca em serviço.
Se quiserem detalhes sobre essa involução, cliquem aqui.
Se vocês lerem o texto a que remete o link, verão que o crescimento da
pesca extrativa foi ridículo e que houve QUEDA na produção de organismos
marinhos cultivados. Ministério pra quê? Ora, para abrigar aliados.
NOTA À MARGEM: o Ministério da Pesca é aquele onde a então ministra
Dilma Rousseff empregou a mulher do terrorista Olivério Medina — e em
Brasília! Agora que as Farc decidiram pôr um fim a seqüestro de civis
(ao menos prometem), o jeito é seqüestrar tubarão no Lago Paranoá.
Ao anunciar a
nomeação, o porta-voz da Presidência lembrou que o PRB é o partido do
“inesquecível” José Alencar, ex-vice-presidente da República. Ô!!! “Nem
me digue!”, como afirmava um antigo vizinho… O PRB tem apenas 10
deputados e um senador, justamente Crivella. Então vamos ver.
Dilma já tem
a fidelidade dessa turma. Não precisa dar um ministério para o grupo,
que é pequeno. Crivella pra quê? Nos bastidores do Planalto, ninguém
disfarça: trata-se de uma tentativa de atrair a bancada evangélica — e
também os eleitores. Duas questões recentes criaram atrito entre o
governo e essa fatia do Congresso.
Na palestra
que fez no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, o ministro Gilberto
Carvalho, hoje a pessoa mais influente no PT depois de Lula, anunciou a
disposição do seu partido de disputar com os evangélicos a chamada
“classe C”. Ele defendeu que o governo invista bastante em mídia estatal
para que se possa fazer o confronto de valores. Já escrevi bastante a
respeito. Explico aqui por que o partido fará um dia, fatalmente, esse confronto.
O segundo
episódio que indispôs os evangélicos com o governo foi a nomeação de
Eleonora Menicucci para o Ministério das Mulheres. Nem havia tomado
posse, saiu em defesa do aborto. Como revelou este blog, numa entrevista
concedida em 2004, contou ter aprendido em clínicas clandestinas da
Colômbia a fazer abortos, como aborteira mesmo, metendo a mão na massa…
de sangue. Crivella, que tem bom trânsito na bancada evangélica, vem
para tentar pacificar a área. Mas será o caso?
Ele já se
manifestou contra o aborto. Certo! Mas o que pensa Edir Macedo, seu tio,
guia espiritual, grande mestre da Igreja? Macedo é o principal
responsável pela projeção que o agora ministro teve como pastor, o que
catapultou a sua carreira política. O dono da Igreja Universal e da Rede
Record é um abortista fanático, talvez o mais fanático de todos, já que
faz o que até hoje não vi ninguém fazer: recorrer à Bíblia para
justificar a prática.
Numa entrevista concedida à Folha em 13 de outubro de 2007, Macedo dizia por que é favorável ao aborto. Leiam:
“Sou favorável à descriminalização do aborto por muitas razões. Porém, aí vão algumas das mais importantes:
1) Muitas mulheres têm perdido a vida em clínicas de fundo de quintal. Se o aborto fosse legalizado, elas não correriam risco de morte;
2) O que é menos doloroso: aborto ou ter crianças vivendo como camundongos nos lixões de nossas cidades, sem infância, sem saúde, sem escola, sem alimentação e sem qualquer perspectiva de um futuro melhor? E o que dizer das comissionadas pelos traficantes de drogas?
3) A quem interessa uma multidão de crianças sem pais, sem amor e sem ninguém?
4) O que os que são contra o aborto têm feito pelas crianças abandonadas?
5) Por que a resistência ao planejamento familiar? Acredito, sim, que o aborto diminuiria em muito a violência no Brasil, haja vista não haver uma política séria voltada para a criançada.”
“Sou favorável à descriminalização do aborto por muitas razões. Porém, aí vão algumas das mais importantes:
1) Muitas mulheres têm perdido a vida em clínicas de fundo de quintal. Se o aborto fosse legalizado, elas não correriam risco de morte;
2) O que é menos doloroso: aborto ou ter crianças vivendo como camundongos nos lixões de nossas cidades, sem infância, sem saúde, sem escola, sem alimentação e sem qualquer perspectiva de um futuro melhor? E o que dizer das comissionadas pelos traficantes de drogas?
3) A quem interessa uma multidão de crianças sem pais, sem amor e sem ninguém?
4) O que os que são contra o aborto têm feito pelas crianças abandonadas?
5) Por que a resistência ao planejamento familiar? Acredito, sim, que o aborto diminuiria em muito a violência no Brasil, haja vista não haver uma política séria voltada para a criançada.”
Atenção!
Respondeu por e-mail. Ele teve tempo de refletir. Na mesma entrevista,
outra pergunta e outra resposta chamam a atenção. Leiam:
FOLHA - Alguns políticos então da base da Igreja Universal, como o bispo Rodrigues, foram atingidos em cheio pelos escândalos do primeiro mandato de Lula. A corrupção não é um pecado imperdoável?
MACEDO - Jesus ensina que o único pecado imperdoável é a blasfêmia contra o Espírito Santo. Para os demais, há perdão se houver arrependimento.
FOLHA - Alguns políticos então da base da Igreja Universal, como o bispo Rodrigues, foram atingidos em cheio pelos escândalos do primeiro mandato de Lula. A corrupção não é um pecado imperdoável?
MACEDO - Jesus ensina que o único pecado imperdoável é a blasfêmia contra o Espírito Santo. Para os demais, há perdão se houver arrependimento.
Agora juntem
a resposta sobre o aborto com esta. É inescapável concluir que o Deus
de Macedo perdoa os corruptos, mas é implacável com os fetos inocentes,
não é?, que ainda não roubaram ninguém. Ele defende essa posição em
livro. O dono da Record recorre a este trecho do Eclesiastes — “Se
o homem gerar cem filhos, e viver muitos anos, e os dias dos seus anos
forem muitos, e se a sua alma não se fartar do bem, e além disso não
tiver sepultura, digo que um aborto é melhor do que ele” —
para inferir que a Bíblia admite o aborto. Falso como nota de R$ 3. Na
passagem, o aborto é visto como o extremo da fealdade, só superado pela
infidelidade a Deus.
Num vídeo em que diz “adorar falar sobre o aborto” e em que trata a criança “como um empreendimento”, Macedo diz o que pensa a respeito. Se quiserem ver, segue aí.
Tragédia
recente acontecida no Brasil, o desabamento de três prédios no Rio,
também mereceu as luzes da turma de Macedo. No vídeo abaixo, ficamos
sabendo que quem derrubou aqueles prédios foi o demônio. Sabem por quê?
Porque haveria lá dentro ex-obreiros e pastores, que desertaram da
Universal e, parece, estavam dispostos a voltar…
Por que lembrar tudo isso? Porque não é a expertise de Crivella com o setor pesqueiro que o leva para o ministério. Ninguém esconde no governo que é a questão, vamos dizer, “religiosa”. Se é, cumpro aqui a minha obrigação ao tratar do assunto em sua devida extensão. Crivella é expressão de um partido, de uma igreja e de uma emissora que têm dono. E esse dono tem um pensamento. E esse pensamento não hesita nem mesmo em atribuir à Bíblia o que lá não está e em fazer uma leitura muito particular de um desastre ocorrido no Estado de origem do ministro agora nomeado.
Plenamente
informado, com todas as variáveis, o leitor pode formar um juízo mais
qualificado. Como vêem acima, o único a fazer juízos de valor é Macedo.
Eu só lido com fatos, digam respeito a peixinhos ou a peixões, e ponho
minha razoável memória a serviço dos leitores.
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